A Fiocruz concederá, na próxima terça-feira (16/12), o título de Doutor Honoris Causa ao cantor e compositor Milton Nascimento, um dos maiores nomes da Música Popular Brasileira. A cerimônia será realizada às 16h, no auditório da Fiocruz Minas, em Belo Horizonte (Avenida Augusto de Lima, 1715, Barro Preto), e o artista será representado pelo maestro de sua banda, Wilson Lopes. A homenagem, aprovada por unanimidade pelo Conselho Deliberativo da instituição, reconhece a relevância da obra de Milton como instrumento de resistência, crítica social e afirmação de identidades ao longo de mais de seis décadas de trajetória artística.
Desde o início da carreira, Milton utilizou a música como forma de denúncia social e enfrentamento das injustiças, especialmente durante a ditadura militar brasileira, quando contornou a censura por meio de experimentalismos sonoros, metáforas e recursos poéticos. Sua produção musical, marcada por intensa força política, espiritualidade e defesa dos direitos humanos, contribuiu para movimentos sociais e inspirou gerações. Suas canções tornaram-se símbolos de luta, como “Milagre dos Peixes” (1974), em que transformou a impossibilidade de ter suas letras aprovadas pela censura em expressão artística, utilizando vocalizações, gritos e falsetes para dizer o que as palavras já não podiam; “Maria, Maria” (1978), que fortaleceu a valorização das mulheres, especialmente as mulheres negras, e se firmou como um hino de coragem e resistência; “Missa dos Quilombos” (1981), que celebra a força e a espiritualidade dos povos negros e pobres da Terra; e “Coração de Estudante” (1983), símbolo das Diretas Já e dos movimentos democráticos no Brasil, amplamente associado às lutas por justiça social e direitos humanos. Em obras como “San Vicente” (1999), Milton reafirmou seu olhar latino-americano, combinando influências musicais diversas e referências históricas e políticas às identidades da América Latina.
“O legado artístico de Milton Nascimento é inegável e sua obra está em sintonia com a missão da nossa instituição. Desde o início da carreira, ‘Bituca’ utilizou seu canto e sua musicalidade como instrumentos de conscientização, transformação social e resistência democrática”, explicou o presidente da Fiocruz, Mario Moreira. “É motivo de orgulho conceder essa homenagem a um dos maiores ídolos da música brasileira, que tem uma carreira marcada pela excelência com reconhecimento também no exterior. A celebração ganha um significado ainda mais especial por ocorrer em Minas Gerais, a terra que o viu crescer e onde nasceu o lendário Clube da Esquina”.
Outro eixo central da trajetória do artista é sua relação com os povos indígenas. Desde os anos 1970, Milton construiu laços profundos com diferentes etnias, experiência que originou o projeto “Txai”, lançado em 1991, após um período de convivência com os povos da floresta no Acre, especialmente os Ashaninka. Essa relação se fortaleceu ao longo das décadas e, em 2010, Milton foi batizado pelos Guarani Kaiowá, no Mato Grosso do Sul, reafirmando seu compromisso com a defesa dos territórios, dos direitos e da sobrevivência física e cultural dos povos originários.
Carreira
Milton Nascimento nasceu no Rio de Janeiro, em 26 de outubro de 1942. Órfão de mãe ainda bebê, viveu em Juiz de Fora (MG) e, depois, em Três Pontas, onde cresceu com os pais adotivos, Lília e Josino Campos, que estimularam desde cedo sua formação musical. Aos 13 anos ganhou seu primeiro violão e, aos 15, formou, ao lado do amigo Wagner Tiso, o grupo vocal Som Imaginário, seguido pelo conjunto W’s Boys, que se apresentava em bailes da região.
No início da década de 1960, mudou-se para Belo Horizonte, onde integrou o movimento que daria origem ao histórico Clube da Esquina, ao lado de Lô Borges, Beto Guedes, Márcio Borges e Fernando Brant, formação que revolucionou a sonoridade da música brasileira e projetou Minas Gerais para o cenário internacional. Em 1967, Milton alcançou notoriedade nacional ao classificar três músicas no Festival Internacional da Canção da TV Globo, incluindo “Travessia”, que conquistou o segundo lugar e marcou definitivamente sua carreira. Sua projeção internacional ampliou-se ainda naquele período, com a gravação de “Courage” nos Estados Unidos, em 1968. Ao longo da carreira, lançou 47 álbuns, participou de 13 filmes, conquistou quatro Grammys e colecionou parcerias com grandes nomes nacionais e internacionais.