20/07/2022
Em 2015, a Organização das Nações Unidas (ONU) estabeleceu 17 metas globais, chamadas Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), visando à construção de um mundo mais justo, próspero e igualitário. Na época, líderes de 193 nações, entre elas o Brasil, se comprometeram a trabalhar para alcançar os ODS até 2030 e, diante desse compromisso, instituíram-se indicadores para acompanhar o avanço dos países em relação às metas. Mas, nos últimos meses, a viabilidade do cumprimento dos ODS vem sendo questionada, devido aos impactos gerados pela pandemia da Covid-19 nas mais diversas áreas. Atentos a essa discussão, pesquisadores da Fiocruz Minas realizaram um estudo para avaliar a evolução dos indicadores relacionados à saúde, nos países do continente americano. Intitulada A Agenda de Saúde Sustentável nas Américas: lacunas pré-pandemia e estimativas para 2030, a pesquisa avaliou 38 indicadores de 33 países, com base em dados divulgados até 2019.
“A pandemia e seus diferentes impactos têm levantando alguns questionamentos e houve até quem afirmasse que os ODS seriam inalcançáveis, já defendendo uma renegociação, antes mesmo de ter informações sobre a situação dos indicadores. Então, neste estudo, avaliamos os gargalos relacionados à saúde nos países do continente americano antes da pandemia e, além disso, fazemos uma projeção para 2030, apresentando as tendências ao longo desta década”, explica o pesquisador Fabrício Silveira, do Grupo de Políticas Públicas e Proteção Social da Fiocruz Minas, um dos coordenadores da pesquisa.
Para avaliar a evolução dos indicadores, os pesquisadores usaram um modelo econométrico de análise de Regressão com Dados de Corte Transversal, em que aspectos econômicos para os quais já existem projeções confiáveis para os próximos anos, como o Produto Interno Bruto per capita (PIBpc), o índice de GINI – que mede a desigualdade social – e os investimentos em saúde, são utilizados para avaliar tanto a performance pré-pandemia dos países nos indicadores, como projetar sua evolução na próxima década.
De acordo com os pesquisadores, o PIBpc mostrou-se significativo em 32 dos 38 indicadores analisados, sinalizando para a relevância do crescimento da renda para o bom desempenho na saúde. Chamam a atenção as taxas de mortalidade infantil e materna, cuja performance abaixo do esperado está diretamente associada ao baixo crescimento econômico. Por outro lado, o estudo mostra que a elevação do PIBpc nem sempre representa avanços nos indicadores. É o caso de tabagismo, alcoolismo e obesidade infantil, que apresentaram um desempenho pior à medida que aumenta a renda per capita nos países americanos. Para os pesquisadores, essa constatação é um sinal de alerta para os formuladores de políticas públicas, mostrando a necessidade de um conjunto articulado de ações para inibir fatores de morbidade.
“Isso mostra que algumas questões estão ligadas à forma como o enriquecimento e o empobrecimento acontecem nos países, ou seja, tem a ver com modelo de desenvolvimento econômico. Assim, ao se pensar em políticas públicas, é necessário considerar, também, como acontece o desenvolvimento em uma determinada região”, destaca o pesquisador Rômulo Paes, também à frente do estudo.
Ainda segundo o estudo, a desigualdade, avaliada pelo índice de Gini, impactou de forma significativa em dez indicadores, com destaque para os de saúde neonatal e infantil, além de lesões, violência e doenças infecciosas, todos com desempenho abaixo do esperado. Também interferiu na performance desses tópicos os investimentos em saúde.
Conforme a pesquisa, a maior parte dos indicadores avaliados nos diversos temas de saúde estavam aquém do esperado na maioria dos países da região mesmo antes do início da pandemia de Covid-19. Por outro lado, os indicadores em que os países se destacam positivamente são aqueles relacionados a riscos ambientais, exceto os que se referem a prestação de serviços seguros de água e poluição do ar. Já as maiores possibilidades de avanços até 2030 estão relacionadas aos temas onde os países apresentaram maiores déficits, como os de doenças infecciosas e de mortalidade materna e infantil. As estimativas também indicam que o estímulo ao crescimento do PIB pode ser uma importante estratégia para o progresso nos indicadores, sobretudo pelo seu papel na ampliação do acesso e cobertura dos serviços de saúde.
Situação brasileira- Em consonância com os demais países do continente, o Brasil apresenta desempenho abaixo das expectativas na maioria dos indicadores. Entre as piores performances, estão os dos que mensuram a atuação do país em relação a doenças negligenciadas e homicídios, situação bem parecida ao que ocorre na maior parte do continente. Outro indicador negativo é o de malária, mas, nesse caso, o Brasil está na contramão do que acontece em grande parte do continente, que apresenta números positivos.
Os pesquisadores destacam que, embora o estudo apresente uma análise dos indicadores em um período anterior à pandemia de Covid-19, é possível afirmar a necessidade de esforços cada vez mais concentrados para o cumprimento das metas dos ODS. Em suas conclusões, os pesquisadores lembram que crise de Covid-19 mostrou que os países com sistemas de proteção social eficazes e cobertura universal de saúde estão mais preparados para responder não apenas às crises atuais, mas também às futuras. Assim, o cumprimento dos ODSs será fator preponderante para enfrentamento e superação da emergência sanitária.
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