Tese de pesquisadora do IRR inspira vídeo-peça sobre violência contra a mulher

08/08/2022

Foi lançada, no dia 9 de agosto, a vídeo-peça Vermelho Carmin- Fragmentos do Discurso Violento, que faz uma abordagem teatral sobre a violência contra as mulheres. O espetáculo é baseado na tese de doutorado da pesquisadora da Fiocruz Minas Elizabeth Fleury, concluída em 2021, e na dissertação de Simone Francisca de Oliveira, do Centro Universitário UNA, de 2010, ambas voltadas para o enfrentamento da violência contra a mulher.  O espetáculo tem direção de Pedro Paulo Cava e textos de Jair Raso e Andrea Silveira Raso.

Ao assistir à peça, o espectador fica diante de algumas cenas reais, reproduzindo diálogos ocorridos entre homens autores de violência e psicólogos de grupos reflexivos existentes em dois programas de atendimento na cidade de Belo Horizonte: o Instituto Albam e o Programa Dialogar da Polícia Civil do Estado de Minas Gerais. Tais homens foram punidos pela Lei Maria da Penha e, durante o ano de 2019, foram encaminhados pelo sistema de justiça a esses grupos de reflexão para cumprir parte de sua pena alternativa. A pesquisadora Elizabeth Fleury-Teixeira acompanhou esses grupos coordenados por psicólogos no decorrer de 48 semanas e, posteriormente, criou minuciosos questionários sobre infância e juventude, que foram respondidos por 137 homens – 30% dos frequentadores desses grupos em Belo Horizonte em 2019. O objetivo foi compreender como se dá a construção da violência, demonstrando que muitas das características do comportamento violento são construídas a partir da socialização que receberam na infância e adolescência.

“Foi um trabalho difícil, pois, para chegar às respostas, é preciso ter acesso à memória desses homens que, por sua vez, vão nos informar sobre valores, sobre a moral aprendida naqueles períodos. Dessa forma, foi necessário convencê-los a se abrir e ainda interpretar a atitude dessas pessoas diante das escolhas que fizeram sobre o conteúdo que você apresenta a elas. Os resultados mostraram que um dos discursos predominantes entre esses homens é o do desamparo, em que os autores de violência demonstram uma insatisfação por estarem sendo criminalizados por adotarem comportamentos pontos de vista aprendidos com base na educação que receberam. Assim, eles se sentem desamparados pela Justiça. Isso porque uma ordem social tradicional está sendo desmontada e suas estruturas sofrem uma flexibilização que não se baseia nos comportamentos aprendidos no sistema anterior. Com isso, surge esse fenômeno do sentimento de desamparo dos homens punidos diante das instituições que regem a vida social”, explica a pesquisadora Elizabeth Fleury.

Segundo a pesquisadora, outros quatro discursos predominam entre os autores de violência. O discurso da ignorância, presente nas declarações de homens que disseram não ter consciência da prática de violência contra mulher. O discurso da crise, explicitado por meio dos relatos de haver uma crise da relação íntima que se torna, então, o foco e objeto de longas análises. O discurso da origem, quando começam a associar valores recebidos e motivações para as violências praticadas. E ainda o discurso da cura, que é a demonstração de adesão à proposta implícita na participação nos grupos reflexivos – a ideia de se tornar um novo homem incorpora a noção da reeducação.

Os cinco discursos estão descritos detalhadamente na tese intitulada Homens autores de violência contra as mulheres: um estudo com participantes de grupos reflexivos em Belo Horizonte , mas também estarão na vídeo-peça. Segundo Fleury, a ideia é apresentar os resultados da pesquisa em uma linguagem lírica e dramática, trazendo a discussão da violência contra a mulher para o campo da arte.

A peça teatral mostra, ao final, a interpretação de um do poema Aos homens, nosso mel e nosso fel, declamado nas escadarias da Igreja São José em Belo Horizonte, em 1980, durante um ato público que desencadeou a fundação do Centro de Defesa dos Direitos da Mulher em Minas e ainda a construção de várias políticas públicas de proteção das mulheres. Na vídeo-peça, o poema, de autoria de Elizabeth Fleury-Teixeira, será interpretado por Dinorah do Carmo, jornalista e atriz, uma das fundadoras do Movimento Quem Ama Não Mata.

Posteriormente, a vídeo-peça ficará disponível em uma plataforma online que será lançada ainda este ano e que contará também com vários depoimentos em vídeos e documentos , como fotos, capas de jornais e revistas, ilustrações, que contam a história do movimento feminista em Minas Gerais. Esta plataforma está sendo criada pelo projeto Vermelho Carmim – Uma História das Mineiras em Luta contra Violência e por seus Direitos.

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