
Celina Modena. Foto: Cláudia Gersen
Nascida na cidade mineira de Três Corações, Celina Maria Modena é um nome importante no campo da Saúde Coletiva brasileira, atuando em temas cada vez mais relevantes para a saúde individual e social. Sua primeira graduação foi em Medicina Veterinária, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRS) em 1977, mesmo ano em que iniciou carreira docente como concursada do referido curso na UFRS. Além disso, Celina possui mestrado em veterinária pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e doutorado na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), respectivamente em leucose enzoótica bovina e infecção experimental e natural pelo Schistosoma mansoni em bovinos.[1]
Em 1981 ela retornou à Minas Gerais, passando em concurso na UFMG, no Departamento de Medicina Veterinária Preventiva da Escola de Veterinária. Dando continuidade ao seu gosto pelos estudos, Celina completou uma segunda graduação em Psicologia, no ano de 2003, pela UFMG. Nesse momento, ela conheceu a pesquisadora Virgínia Schall na Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, que estava estruturando o programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde do IRR, e convidou Celina para trabalhar no Instituto, na área de educação e saúde. Em 2004, ela começou sua carreira na Fiocruz Minas, como bolsista, aposentando-se do cargo de professora adjunta da UFMG. Celina passou a atuar em projetos do Laboratório de Educação e Saúde, coordenado por Virgínia Schall, além de ministrar aulas e orientar alunos de mestrado e doutorado na Pós-graduação em Ciências da Saúde, tendo sido vice coordenadora entre 2010 e 2012. Após criação no IRR da Pós-Graduação em Saúde Coletiva, em 2012, a pesquisadora passou a atuar mais fortemente nesta área, e hoje se dedica ao conhecimento transdisciplinar na Saúde Coletiva, principalmente em saúde mental com enfoque na psicologia. Ela tem atuação marcante na pesquisa qualitativa em saúde, e atualmente é coordenadora no IRR da disciplina ciências sociais e humanas em saúde. Nesta área orientou vários alunos que hoje são professores universitários, além de servidores municipais e estaduais que buscam, cada vez mais, a pós-graduação do IRR para aprimoramento na atenção em saúde, principalmente na área mental.
Em toda a sua trajetória na Fiocruz Minas, a pesquisadora salienta a importância de ter convivido e trabalhado com Virgínia Schall, na área de educação e saúde.[2] Como exemplo Celina cita o projeto desenvolvido em Jaboticatubas/MG que se transformou em seu pós-doutorado entre 2005 e 2006, e no qual ela conseguiu dialogar e engajar a população na sensibilização contra a esquistossomose, focando principalmente na representação social intergeracional da comunidade, sem estigmatizar os moradores. Além dessa iniciativa, Celina e Virgínia trabalharam juntas em outros projetos, com temas variados: violência no ambiente de trabalho; educação e sexualidade na adolescência; sustentabilidade hídrica; câncer e masculinidade.
Após o falecimento de Virgínia Schall e a restruturação do seu grupo de pesquisa, Celina passou a atuar no grupo em que permanece até hoje, Políticas Públicas e Direitos Humanas em Saúde em Saneamento (PPDH). Ela tem se notabilizado pela sua contribuição à Saúde Coletiva nacional, sendo reconhecida com o 1º Lugar do Experiências Exitosas em Saúde Coletiva – Interface entre Saúde e Educação: uma experiência de promoção à saúde sexual no contexto escolar, concedido pela Escola de Saúde Pública (ESP), em 2009. A pesquisadora publicou cerca de 172 artigos científicos, além de livros e capítulos. Orientou, até o momento, 39 dissertações de mestrado e 23 teses, atuando também na orientação de estudantes de Iniciação Científica. Desempenhou a função de Consultora do CNPq, da FAPEMIG e CAPES e foi Membro do Comitê Interinstitucional de Epidemiologia da Secretaria Estadual de Saúde do Estado de Minas Gerais. Foi membro do Comitê de Ética em Pesquisa do IRR, trabalho que ela considera fundamental para a proteção de pessoas e populações vulneráveis na prática científica.
Além das já citadas contribuições no campo da Saúde Coletiva, ela também tem um olhar diferenciado aos grupos invisibilizados, não apenas socialmente, mas que demoraram a ser percebidos como sujeitos de pesquisa no campo da saúde, como pessoas LGBTQIA+, usuários de drogas e álcool, mulheres camponesas, crianças autistas e com obesidade, etc.[3] Os estudos de Celina se notabilizam por uma perspectiva integral da saúde, onde a condição física, as doenças, questões de sociais e de saúde mental atravessam o ser humano e o constituem em seu todo e em suas especificidades. Por essa razão a pesquisadora tem trazido para a Saúde Coletiva temas cada vez mais abrangentes, como direitos humanos e meio ambiente, considerando, nos seus estudos, como as relações de poder e um ambiente saudável são fatores que impactam a saúde dos indivíduos e da sociedade. Sua trajetória condensa os princípios base da Saúde Coletiva, conectando saberes biomédicos e as ciências humanas para além de fronteiras pré-definidas, de modo a abranger a complexidade da saúde, que não se reduz a uma única área.
Na sua vivência no IRR, Celina conta que a instituição mudou muito, tanto do ponto de vista da estrutura física quanto da dinâmica de trabalho. Diz sentir-se valorizada na instituição, e que o IRR, sendo uma unidade de médio porte, permite maior proximidade entre a direção e os demais trabalhadores. No entanto, gostaria de ter maior participação nas decisões estratégicas da instituição.
A pesquisadora ressalta como o IRR é especial, pois a instituição se destaca como referência na educação em saúde, promoção da saúde, vigilância epidemiológica, sempre em alinhamento com o Sistema Único de Saúde (SUS). Celina considera importante que a Fiocruz Minas possa ter, no futuro, linha de pesquisa em saúde do trabalhador, para discutir o processo laboral como conhecimento, além da sua importância na formação da identidade pessoal dos servidores. Para se aprofundar nessa e outras questões, a pesquisadora pretende estudar filosofia.
A marca da trajetória profissional de Celina Modena é a curiosidade científica e a capacidade de se reinventar, resultando em pesquisas transdisciplinares extremamente relevantes no campo da Saúde Coletiva. Mesmo após sua aposentadoria na UFMG ela continua trabalhando, e diz que a atuação no IRR deu sentido à sua vida, segundo ela: “são 20 anos de sentido”.
Realização: Núcleo de Memória Institucional da Fiocruz Minas
Agradecimento: Celina Maria Modena, pela entrevista concedida no dia 04/06/2025, no IRR, Belo Horizonte.
[1] MODENA, Celina M.. Leucose enzoótica bovina: I. Comparação entre métodos diagnóstico. II. Evolução sorológica em bezerros. III. Interferência com a vacina anti-Febre Aftosa, UFMG, 1981; Avaliação da infecção experimental e natural pelo Schistosoma mansoni (Sambon, 1907) em bovinos: uma abordagem epidemiológica, UFRRJ, 1989. Currículo Lattes. Disponível em: <http://lattes.cnpq.br/8632329526181697>.
[2] MODENA, Celina M. Entrevista concedida ao Núcleo de Memória Institucional do IRR, 04/06/2025, Belo Horizonte/IRR. Entrevistadora: Gláudia Gersen.
[3] Ver: FARIA, A; GOMES, A; MODENA, C. Estratégias de enfretamento contra as violências contra lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais. Cadernos Saúde Coletiva, vol. 33, p. 01-11, 2025; LACERDA, D; BAVILACQUA, P; MODENA, C. Cuidado Performativo: Uma Articulação Entre a Arte e Saúde Mental no Cuidado de Pessoas que Usam Drogas. Saúde Coletiva, vol. 15, p. 15193-15200, 2025; FONSECA, M; PARREIRAS, L; MODENA, C. Primeiro ele, depois o resto: repercussões da paternidade de crianças com autismo na saúde dos homens. Revista Desafios, vol. 11, p. 1-24, 2024; FRONTZEK, L; BERNARDES, L; MODENA, C. Obesidade Infantil: Compreender para Melhor Intervir. Revista da Abordagem Gestáltica, vol. XXIII, p. 167-174, 2017; SANTOS, M; SOL, N; MODENA, C. Território e desterritorialização: o sofrimento social por desastre ambiental decorrente de rompimento de barragem de mineração. Saúde em Debate, vol. 44, p. 262, 2020; RÜCKERT, B; MODENA, C. O cuidado em saúde de mulheres camponesas como atividade de trabalho. Ergologia, vol. 22, p. 51-67, 2019. In: Currículo Lattes. Disponível em: <http://lattes.cnpq.br/8632329526181697>.